Natimortos
Parafina, tinta de óleo, chocolate, gesso, folha dourada, corda de algodão, papel
Módulo: 42.5 x 30 x 12 cm
Instalado: dimensões variáveis.
2018
Módulo: 42.5 x 30 x 12 cm
Instalado: dimensões variáveis.
2018
Olhar para eu. Afirmar-se como um ser autêntico, consciente de si.
Atos proibidos numa sociedade que prega a existência somente em prol do outro, que despreza o indivíduo em favor da construção de um coletivo.
Impõe um eu pré-definido exterior a nós. E nós, com medo de desenvolver uma imagem própria autodepreciativa, submetemo-nos e depravamo-nos. Deixamos de procurar “olhar para dentro”, de valorizar o autoconhecimento. Passamos antes a concentrar-nos numa imagem, num eu aparente que distorce o conceito de si. “A imagem de si (ideal, imaginária, ditada pela norma não imaginária do político-social-moral-psicologicamente correto) impõe regras de comportamento, interioriza interditos, autocensura o indivíduo. Constitui um limite severo à livre expressão, ao pensamento e à acção livres.” (Gil, 2005:80)
Deixamos de saber quem somos, quantos somos, o que somos. Como se vivêssemos “vidas alheias (…) Uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço” (Pessoa, 1915?). Como se o “si autobiográfico” (Damásio, 2001:204) deixa-se de ser construído pelo sujeito próprio e fosse unicamente produto de um meio exterior, como um carro puxado a reboque.
Materializamos os eus ilusórios que os outros projetam em nós, como se as possibilidades que o momento do nascimento nos oferece já estivessem definidas por outrem e todas as outras novas que, porventura, lutássemos por ter, resultariam apenas riscos e desgraças. Mas é o contrário que acontece. É o não ser autêntico, o deixar o interior corroer-se pelo exterior que leva a cair em desgraça, o ser totalmente submisso ao que a sociedade impõe que nos deixa infelizes, incompletos, depravados. É quem personifica o papel que lhe é imposto e não procura o seu próprio que não se sente em si. A doçura da mulher que lhe ditaram ser dona de casa, não revela ser mais que um disfarce da violência que sofre todos os dias. O sucesso de quem lhe foi entregue uma empresa para as mãos não resulta senão da sua falta de escrúpulos. A pureza de quem lhe incitaram a observância da devoção esconde os prazeres que não consegue controlar.
Precisamos de nascer! Não ser somente um recurso do outro, mas também um eu que se percebe, constrói e afirma.